terça-feira, 31 de março de 2020

Um homem e seu carnaval

Canto do Livro: O homem e seu carnaval


Um homem e seu carnaval - Carlos Drummond de Andrade

Deus me abandonou
no meio da orgia
entre uma baiana e uma egípcia.
Estou perdido.
Sem olhos, sem boca
sem dimensões.
As fitas, as cores, os barulhos
passam por mim de raspão.
Pobre poesia.
O pandeiro bate
é dentro do peito
mas ninguém percebe.
Estou lívido, gago.
Eternas namoradas
riem para mim
demonstrando os corpos,
os dentes.
Impossível perdoá-las,
sequer esquecê-las.
Deus me abandonou 
no meio do rio. 
Estou me afogando 
peixes sulfúreos 
ondas de éter 
curvas curvas curvas 
bandeiras de préstitos 
pneus silenciosos 
grandes abraços largos espaços 
eternamente.


A man and his carnival - Carlos Drummond de Andrade

God abandoned me

in the middle of the orgy

between a Bahian and an Egyptian.

I'm lost.

Without eyes, without mouth

without dimensions.

The tapes, the colors, the noises

graze me.

Poor poetry.

The tambourine beats

it's inside the chest

but no one notices.

I'm livid, stutterer.

Eternal girlfriends

laugh at me

demonstrating the bodies,

the teeth.

Impossible to forgive them,

don't even forget about them.

God abandoned me

in the middle of the river.

I'm drowning

sulphurous fish

ether waves

curved curves curved

flags of prstitos

silent tires

big hugs wide spaces

forever.

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